Jesus se esvazia para gerar comunhão
A convivência com Jesus convocou os seus primeiros discípulos a uma grande comunhão entre eles. Dentre os gestos do Mestre, há um que os marcou de modo especial: o lava-pés. Trata-se da apresentação que o Evangelho segundo João faz da Última Ceia de Jesus com os discípulos. É o modo como João nos revela o sentido do dom eucarístico de Jesus aos seus.
Naquele encontro, Jesus quis indicar a medida do amor que tinha para com os discípulos, um amor sem reservas, disposto a fazer o bem até o limite extremo de dar “a vida pelos amigos” (Jo 15,13).
Antes da festa da Páscoa, durante a ceia (cf. Jo 13,1-2), Jesus se levanta da mesa, “depõe o manto e, tomando uma toalha, cinge-se com ela Depois põe água numa bacia e começa a lavar os pés dos discípulos e a enxugá-los com a toalha com que estava cingido” (Jo 13,4-5). Esse gesto de Jesus ajuda a reconhecer o sentido do seu caminho
rumo à cruz. Mas não foi na Última Ceia que ele se abaixou pela primeira vez como servo. São Paulo nos apresenta o mistério de Jesus como sendo um contínuo abaixar-se para encontrar a humanidade. Paulo insere na Carta aos Filipenses um antigo hino de rara beleza, onde Jesus é apresentado como aquele que se abaixou, que se rebaixou. Ele, que sendo de “condição divina, não considerou como presa a agarrar o ser igual a Deus. Mas despojou-se, tomando a condição de servo, tornando-se semelhante aos homens” (Fl 2,6-7). A Encarnação, portanto, enquanto mistério que realiza uma comunhão única entre Deus e a humanidade, já é uma ‘descida’, um abaixamento vivido pelo Filho de Deus. Mas o hino continua dizendo que ele se abaixou ainda mais, “tornando-se obediente até a morte, e morte de cruz” (v.8). Assim, Jesus também se une à humanidade pela morte mais humilhante, em comunhão com toda experiência de ‘desumana’ ausência. Não há ser humano que, pequeno e humilhado por uma condição ou situação, fique sem ser alcançado por Jesus em seu ‘abaixar-se’, em seu amor que se faz próximo e envolvente.
Tu desceste até nós!
Santa Teresa do Menino Jesus. Obras Completas. pp. 176-177.
Oh, Verbo Divino! [...] És tu que, descendo à terra de exílio, quiseste sofrer e morrer a fim de atrair as almas até o seio da Fornalha Eterna da Bem-aventurada Trindade! És tu que, voltando à Luz inacessível, que doravante será tua morada, ainda permaneces no vale de lágrimas, oculto sob a aparência de uma branca hóstia. [...] Queres nutrir-me com tua divina substância, a mim, pobre criaturazinha que voltaria ao nada se teu divino olhar, a cada instante, não me desse a vida...
Jesus percorre a via crucis servindo os homens e mulheres de todos os tempos. Abaixa-se, abraça-nos, estabelece a comunhão. É por isso que o gesto do lava-pés indica a presença eucarística de Jesus como Servo da humanidade, nos levando a compreender que também nós, seus seguidores, devemos ter os mesmos sentimentos de nosso Mestre, Cristo Jesus (cf. Fl 2,5), e somos chamados a fazer o que ele fez. – “Compreendeis o que vos fiz? (...) Se, portanto, eu, o Mestre e o Senhor, vos lavei os pés, também deveis lavar-vos os pés uns aos outros” (vv. 12-14). O mandato do relato eucarístico – “fazei isto em minha memória” (Lc 22,19) – tem uma correspondência no relacionamento entre os discípulos, indicada pelo “deveis lavar-vos os pés uns aos outros”, constituindo-os como comunidade. A fórmula litúrgica, o rito e a expressão cultual requerem também uma ‘fórmula comunitária’ de compromisso de amor, de um amor que se inclina diante do outro,
que se abaixa para acolher e servir, para promover os relacionamentos e a vida entre discípulos.
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